terça-feira, 14 de julho de 2009

Camarote TvCom direto do Museu do Trabalho


Na última sexta-feira, dia 10 de julho, o programa Camarote, da TvCom, foi transmitido ao vivo da Oficina do Museu do Trabalho. Decio Antunes, Maria Waleska van Helden e Fabiane Severo concederam entrevista para Kátia Suman no primeiro bloco do programa.

Por trás da aparência, a essência de Corte


Por Antonio Hohlfeldt


O novo espetáculo dramático-coreográfico de Decio Antunes chama-se, não por acaso, Corte. Logo que se entra no espaço da Usina do Trabalho, totalmente modificado para a performance, encontramos uma espécie de paisagem de "dia depois". Carcaças de automóveis espalhadas por tudo, tubos de televisão com imagens fixas - que depois serão acionadas, em circuito fechado - rampas de acesso, e toda a estrutura de galpão a que estamos acostumados naquele espaço. Realmente, a impressão é de final de mundo, de um caos que segue a uma destruição absoluta.

Sete bailarinos vão se revezar , durante quase uma hora de espetáculo. Arrastam/arrastam-se pela cena, solitários, como que a perambular sem rumo , ou trazendo consigo outros corpos tão confusos e perdidos quanto os seus próprios. Câmeras de televisão projetam, nos visores, imagens variadas da mesma cena. Em outros momentos, recuperam-se imagens documentaisde momentos críticos - de corte - da história da civilização: Hitler, guerras localizadas, bomba atômica em Hiroshima, as lutas fraticidas da África. O espetáculo de Decio Antunes não é nada cor-de-rosa mas, ao mesmo tempo, o simples fato de ser idealizado e executado atesta um resquício de esperança na humanidade. Se não... para que nos provocar?

Trata-se de um ritmo lento, de uma certa provocação ao espectador, levando-o a refletir sobre a atual condição humana, tanto psicológica quanto cultural e política. Como diz o texto de apresentação, não é cético nem esperançosos: é provocador, e neste sentido, enquanto obra de arte, cumpre sua principal função, levar o espectador a sentir e a pensar, conscientizar-se e visualizar-se naquele contexto.

O figurino de Coca Serpa explora cores escuras, da mesma maneira que a iluminação de Bathista Freire e Guto Grecca, na cenografia de Félix Bressan criam espaçosde claro-escuro que revelam-se escondem realidades díspares e contraditórias. Estamos diante da civilização de consumo que tudo põe fora, inclusive o ser humano - daí a bailarina que se esconde se revela dentro de uma geladeira. Ou de uma civilização que trabalha com as sobras da destruição - e então as carcaças do automóvel, talvez um dos mais radicais símbolos do non-sense da passagem do século XX para o atual. A simbiose entre o trabalho com o corpo humano - elemento natural - e a tecnologia - elemento artificial - está equilibrada e revela, claramente, o que poderia ser, mas não é. Para que isso funcionea contento no espetáculo, contudo, é fundamental, de uma lado, o perfeito controle de toda esta maquinaria por parte dos responsáveis pelo trabalho, de um lado e, de outro, a perfeita simbiose entre as intérpretes, no caso, os bailarinos. Cristina Camps, Fabiane Severo, Graziela Silveira, Maria Albers, Patrick Vargas, Robson Duarte e Stela Menezes mostram um preparo físico perfeito e uma dedicação absolutamente admiráveis para a concretização do trabalho, que não tem nenhuma facilidade para qualquer dos intérpretes.

Para quebrar o (falso) espetáculo da vida, Corte, por isso mesmo, nos obriga a uma parada: ao cortar o fluxo aparentemente natural do cotidiano, traz-no à realidade concreta, ao que normalmente se esconde por trás da aparência; Não é casual, por certo, a referência a uma passagem de Macbeth, dada no original, nem os textos em alemão, quando se fala da destruição em massa, em clara alusão ao nazismo e seus seguidores, ainda hoje presentes entre nós. Aliás, todos o espetáculo se constitui numa espécie de paródia de textos conhecidos como Sófocles e Eurípides, talvez o próprio Albert Camus de A peste, além do já citado mais acima, articulando-se com as imagens documentais e aquelas geradas a partir do próprio espetáculo.

Corte interrompe a vida para nos levar a pensar sobre ela. A notícia, que é quase sempre espetacularizada pela televisão, aqui é recuperada, nas imagens documentais, para nos fazer entrar em sua aparência e descobrir seu sentido mais profundo. Em suma, trata-se de um excelente momento de Decio Antunes, enquanto criador, trabalhando a partir de quem tem em mãos: a excelente potencialidade dos bailarinos e as possibilidade variadas que a tecnologia lhe permite.


*Coluna publicada no Jornal do Comércio do dia 3 de julho de 2009.



Por Antonio Hohlfeldt

Grupo Tholl (e mais uma vez, Corte)


Quero corrigir uma falha cometida na coluna da semana passada, que foi a omissão do nome da coreógrafa Maria Waleska van Helden no comentário sobre o espetáculo de dança-teatro Corte. Uma das coisas que gosto neste caminho que o diretor Decio Antunesvem trilhando é justamente a perfeita simbiose entre a coreografia e o conjunto da cena, dando naturalidade e unidade. Talvez por isso mesmo omiti a coreógrafa, sem deixar de valorizar sua intervenção. A coreografia de Corte tem um mérito especial: ela é natural mas é expressiva. Tudo está medido, pensado, 're-significado', de maneira a evidenciar, no pequeno e lento gesto, aquilo que a direção pretende expressar. Daí sua qualidade: é verdadeiramente um belo diálogo de dois artistas, que só podemos agradecer.
*Coluna publicada no Jornal do Comércio do dia 10 de julho.