quinta-feira, 28 de maio de 2009

Palpite Cultural


Sobre Teatro! O espetáculo CORTE
Vivemos num mundo meio que de cabeça pra baixo. As coisas passam por nós tão rápido e com tanta informação que não temos sequer tempo para assimilar seus sentidos. Todos perdidos e ao mesmo tempo presos num emaranhado de obrigações morais e convenções cotidianas.
Num determinado momento as luzes se apagam e cessa o movimento dos atores. Um silêncio, ninguém sabe se acabou, ou se esse silêncio faz parte do roteiro. De repente, sem ter muita certeza, alguém no público aplaude, seguimos o corajoso. Foi o fim.
Saímos do teatro vazios de pensamentos e tremendo de emoções ainda não definidas. A intensidade das interpretações, a grandiosidade do cenário e a genialidade ali apresentada, choca. Não notamos o final, não sentimos o corpo caminhar, sair do lugar. “Não entendi nada” é a primeira coisa que vem a cabeça. Precisa de tempo, tempo para assimilar, logo tudo faz sentido, “entendi”.
O corte dói mesmo. Evidencia muita coisa que não paramos pra pensar e machuca porque não trás soluções. Vemos o passado e o passar do tempo. Dá agonia ver aqueles seres perdidos, presos. Os gritos que ouvimos não saem do palco, mas do público. De dentro de cada um. As fraquezas humanas expostas ali, sem julgamentos. Apenas a exposição do que fica por dentro.
É um daqueles espetáculos que não podemos deixar de ver. Não por ser a grande sensação do mundo cult-intelectual-paga-pau. Mas porque realmente corta. E se precisamos de alguma coisa nesse mundo maluco, é de um basta. De um corte, de uma dor insuportável que nos faça parar e por fim, depois de tanto tempo sem fazer isso, pensar.

Texto postado no blog Palpiteiros http://palpiteirosrs.blogspot.com/

Um corte curado

Pela minha vista, ora do lado esquerdo, ora do lado direito, mas sempre de frente, pude olhar o “Corte” como um corte suturado. As cenas mostravam corte, mas tive sensação de resolvido. Já tinham cortado, e vi a cicatriz. Corte suturado é a união de coisas que foram separadas e agora se encaixam por meio de recorte dentado. Coseram, sintetizaram.
Corte é masculino. Sutura é feminino. Vi a junção.
Corte é um caminho que a faca faz, ou a tesoura faz, papel às vezes também é corte, pedra quando em movimento também, aliás as mudanças que a pedra faz quando começa a se mexer, muda a geografia! Fechar os olhos também, não muda a geografia, mas muda a realidade e a história... mas tinha outras coisas: lembranças, infância, fé, eu vi fé nos olhares, assim, querendo construir tudo novo de novo e de novo.
Um espetáculo residual. Instrumento afiado, mas ao mesmo tempo reconstrutor, costurado, cicatrizado e curado. Não há marcas sem corte.
Aniuska Van Helden, jornalista

Comentário - Cristina Zarif Severo


Como farmacêutica homeopata, a minha leitura do “Corte” relacionou a homeopatia, a mitologia grega e o cristianismo.
Segundo a doutrina da homeopatia, quando no Paraíso Eva e Adão cometeram o “pecado original”, houve o sentimento de culpa, o qual nós carregamos após o nascimento. Este sentimento é manifestado individualmente de maneira diferente: ambição, inveja, avareza, poder, ciúmes, sentimento de abandono...
O primeiro trauma é a expulsão do útero onde saímos de um lugar seguro para enfrentar um mundo que desconhecemos, gerando angústia, insegurança e medo.
Assim como na mitologia grega, as histórias de ira aos deuses e as consequentes tragédias, a homeopatia revela porque cada um de nós reage diferente no que se refere às emoções e sentimentos. No CORTE, a atitude da personagem que foi traída, a personagem que teve sua maternidade negada, ambição de poder, ciúmes e a visão cega demonstram estas diferenças.
No mundo, em nome de idéias e religiões ocorrem muitas situações trágicas relacionadas ao complexo de culpa desde o nascimento e, mesmo assim continuamos lutando pelos nossos objetivos, em uma busca incessante.
As catástrofes no meio ambiente estão ligadas à ambição, à ganância e o poder que poderá levar a uma situação desoladora.

Cristina Zarif Severo

quarta-feira, 20 de maio de 2009

terça-feira, 19 de maio de 2009

Profundo Corte - Comentário de Norman Hauschild




Luzes se apagam. E a plateia não sabe o que fazer. Se aplaude ou se espera. Fim do espetáculo? Acabamos aplaudindomesmo sem entender ao certo o que terminamos de ver e sentir. Muita informação. Muita abstração. Pensamentos livres, voam. Impossível não sermos profundamente tocados, feridos.Todos ainda atordoados. Vida. Morte. Seres descrentes, faces perdidas pelo cenário. Buscando o quê? Olhares penetrantes, intrigantes, que nos desnudam. Futuro. Passado. Presente. Física. Química. Linguagem.Quem sabe? Espetáculo chocante. Denso. E que cenário! Carcaças de carros, refigerador, rampa, roda, imagens, plateia, vozes, inglês, alemão, faca, tragédia, corpos, almas... Nós, atônitos, sendo chamados para o palco, sendo puxados por uma grande roda, grande ímã, cuja energia crescia ao subir a grande montanha e ao cair devolvia sua energia acumulada. Energia potencial. De uma certa forma, parte de nossa energia se foi com ela, para um grande buraco desconhecido. Esta peça tem que seguir adiante, pelo estado afora, pelo Brasil afora. Muita gente tem que assití-la neste ano. Discutida. Interpretada. Digerida. Bebida. Terminar no meio universitário, no Salão de Atos da UFRGS, no portinho. Se este profundo Corte ainda vai cicatrizar um dia não se sabe...

terça-feira, 12 de maio de 2009

Comentário de Élvio Vargas sobre o Espetáculo Corte


Tic-Tac...Tic-Tac...(...) Seres habitam e vagam sobreviventes em um espaço que pode ser de todos. Desde os tempos mais remotos que o homem sente a presença do tempo, através da luz e da treva. Imemorial, remoto, inalcançável dentro de sua própria medida, travestido de nuanças, porém, resoluto na sua dimensão de invisível imponência. Esfíngico, ele surge na hora da semeadura, alegre e sinistro, ressurge na colheita. Assim ele vai catalogando seus milésimos, que para nós representam séculos. Se na era agrícola seus assombros eram de binárias rotações cósmicas, na era industrial a mudança é drástica. Ele está nas engrenagens, nas ferramentas, rótulo, trabalho, capital, na usura e no lucro. Hoje ele não é mais linear, está fragmentado, obíquo- é mais DEUS ainda- forte, severo, ameaçador. Como se por si só seu império não fosse devastador, os homens lhe deram uma grande aliada, dotaram-no de uma voz feminina, uma sibila eletrônica que lhe devolveu o oráculo. Ele já foi Heródoto, Sófocles, Napoleão, o terceiro Reich, está entre os avisos de meteorologia, anuncia a guerra, concede a paz, tudo depende do seu humor. Esquarteja-nos, dota-nos da cegueira de Homero e cicatriza nossa visão com os olhos de Borges!!!...(...) tempo tempos memória passado presente passado presente futuro? somos reféns de nossas próprias orfandades, exorcizamo-nos através do castigo. São terríveis as facas de Medéia, elas não foram afiadas para ferir, foram forjadas para matar. Matamos tudo e somos salvos pela oculta página da memória!!!É no inventário das lembranças que reeditamos a cidade dos arquétipos.
A pedra de Sísifo é o moinho que sopra nossa urdidura, viveremos com ela até o fim de nossos dias...por excesso de tempo, CORTO aqui...Tic-Tac...Tic-Tac...
Élvio Vargas

Comentários de Marilu Goulart sobre a pré-estreia do dia 8


CORTE
Corte causa dor. Tudo se passa na superfície. Não há profundidade, moral, nem história. Apenas fluxos que produzem encontros e evidenciam solidões. Um estar só no mundo. Mundo frio, cru, tecnológico, onde, por vezes, uma suavidade invade o ambiente e transforma os corpos. A música habita este mundo de sonâmbulos: corpos oprimidos pelas formas-formalidades já não conseguem seguir/fazer os rituais próprios da cultura. Uma gravata pode compor o vestuário e pode também ser um instrumento de morte, por vezes, lenta. Corpos desarticulados, das sempre mesmas formas de viver e se relacionar, são arrastados em cena e desfilam sob nossos olhos doloridos. Em corte, há uma ausência de culpa, certamente pela ausência de qualquer transcendência. Tudo é imanente, não há nada por trás, uma verdade a ser descoberta, uma moral da história, ou mesmo qualquer simbolismo ou metáfora. Um corte no tempo: e quem assiste não é mais expectador. Sente a dor de estar exposto na sua humanidade sem perspectiva de uma forma definida. Corte acorda por 50 minutos do sonambulismo em que se vive. Não há mais esperança. Porque não há futuro. Não há história. Há um narrador. E o ponto de vista é a nova comédia que substituiu Deus. As intensidades invadem os corpos. Não há segunda aposta. Todas as fichas numa única jogada. Ou nada. O que tem de esperança em Corte é a ausência da relação desta com o futuro. O tempo é da ordem do imediato. Não há dicotomias. Nem julgamento (de valores). O que dá certo alívio na exposição de tanta crueza é a possibilidade concreta de uma nova forma de liberdade. De experimentação da vida. Desde que se abra mão das certezas e se abra o corpo para as intensidades, quase sempre violentas, da vida. Nem boa nem má, necessária para que se imploda este corpo sonâmbulo, esta insônia agonizante. E se produza um corpo não organismo, não organizado. Que saiba se relacionar com o mundo nesta multiplicidade de partes que somos e que ele é. E produzir encontros. Corte abre uma ferida. Bem no meio de nossa humanidade carcomida pelo mesmo. Não propõem nenhum modelo. Nem permite um passo atrás. Esta é sua violência. E talvez sua única dicotomia: permanecemos sonâmbulos, ou nos permitimos sermos atingidos pelos punctuns. Sobre o figurino, comentei sobre sua beleza e ouvi que, ele de bonito, rouba a cena. Eu, que não entendo nada disto, só posso dizer que gostei. Ao meu lado meu filho de 10 anos, a certa altura me disse: “mãe, não tô entendendo nada”. Isto não me causou surpresa. Me fez pensar na educação. Mas não vou entrar nesta questão. Sempre se espera, afinal, a moral da história, um enredo, alguma linearidade que nos oriente. Pensei “ainda há tempo, sempre haverá”. Em corte, há espaço para o pensamento (na educação não), pois há espaço para a dúvida, a angústia, a incerteza, a sensibilidade, a música... Não é, porém, um espetáculo para ser visto uma única vez. A forma está em questão e o estilo (enquanto existência) precisa ser repensado. Desta vez, a primeira, é o que tenho a dizer.

Entrevista no Band News Edição de Sábado

No dia 9 de maio Decio Antunes e Maria Waleska Van Helden concederam entrevista para o repórter Filipe Peixoto da rádio Band News Porto Alegre.

Portal Hagah


Corte no Capital Gaúcha


Corte no Speakorama


Espetáculo no Blog Infodansa


Decio e Maria Waleska no Gaúcha entrevista


Corte na agenda do Terra


Corpos em corte - vídeo de Robson Duarte

http://www.youtube.com/watch?v=75KfOhg2vho

Matéria no Jornal Zero Hora


Cicatrizes do mundo
“Corte” estreia amanhã no Museu do Trabalho


Corte pode significar um ferimento. Mas também pode ser entendido como a interrupção de um processo. Nos meios acadêmicos, corte pode ser traduzido como um viés assumido por um observador. O espetáculo Corte, que estreia amanhã, no Teatro do Museu do Trabalho, admite todas essas interpretações e ainda mais: é o novo espetáculo do diretor Decio Antunes.A expectativa em torno de Corte é considerável, afinal, duas outras montagens de Decio Antunes – Mulheres Insones (2006) e A Casa (2007) – venceram o Açorianos de melhor espetáculo de dança. Mas as preocupações do encenador são outras. Segundo ele, Corte quer colocar em cena um momento histórico limite:– A primeira década do novo milênio é pautada por intolerância religiosa e étnica, catástrofes ambientais e financeiras, controle cada vez maior do indivíduo. A cidade expõe suas cicatrizes. O que virá depois?Para transformar isso em teatro-dança, Antunes contou com parcerias já confirmadas: Maria Waleska Van Helden na coreografia, Felix Bressan projetando a cenografia e Coca Serpa criando os figurinos. O resultado final é próximo de um flagrante pré-apocalipse. O Teatro do Museu do Trabalho perdeu arquibancadas para que uma avenida cruzasse o espaço. Em torno dela, o público tentará se acomodar cercado por um ambiente de excesso de informação e movimentos enérgicos e viscerais. Monitores de TV e telas de computador espalhados pela sala estarão pulsando no ritmo do caos urbano.Antunes observa que Corte (que tem patrocínio parcial do Fumproarte e apoio da CEEE via Lei Rouanet) garante mais espaço à palavra, se consideradas Mulheres Insones e A Casa. As falas partem de um observador onisciente, que às vezes tenta propor uma análise racional do que observa, algumas vezes persegue um impacto poético, outras contenta-se em apenas ser uma palavra entoada em meio à desordem. Para construir o texto, Antunes repetiu o método de buscar em autores clássicos e contemporâneos o verbo certo.– Há ecos de Sófocles, Eurípedes, Shakespeare, Lorca e Heiner Müller. Mas se destaca Beckett. A obra dele, especialmente Fim de Partida (1957), resume o que vivemos agora.Se, em Fim de Partida, duas pequenas janelas permitiam vislumbrar um aceno de salvação, em Corte esse papel fica a cargo dos monitores. A tecnologia é a salvação? Ou a comunicação? Ou o abuso delas colocará o mundo a perder? Antunes não se preocupar em fechar questão:– Pelo contrário. Espero que o Corte seja largo e profundo o suficiente para que cada um faça sua leitura. Mas vamos continuar sorrindo, não é? Estamos sendo filmados...


RENATO MENDONÇA

CORTE
Coreografias de Maria Waleska Van Helden e direção de Decio Antunes.
Com Cristina Camps, Fabiane Severo, Graziela Silveira, Maria Albers, Patrick Vargas, Robson Duarte e Stela Menezes.
Às sextas e sábados, às 21h, e aos domingos, às 20h. Estreia amanhã, às 21h. Duração: 60 minutos. Temporada até 26 de julho. Classificação: 14 anos.
Teatro Museu do Trabalho (Rua dos Andradas, 230), fone: (51) 3227-5196.
Ingressos: R$ 20, com desconto de 50% para maiores de 60 anos e para estudantes.
O espetáculo: em um cenário apocalíptico, a montagem de teatro-dança do grupo JogodeCena quer discutir as disputas entre nações, culturas e crenças que marcam o início do milênio e a dificuldade de comunicação das grandes cidades..